domingo, 28 de junho de 2009

Uma Visão Memorável - William Blake

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Os profetas Isaías e Ezequiel jantaram comigo, e eu lhes perguntei como ousavam tão redondamente afirmar que Deus lhes falara; e se não pensaram na época que seriam mal-compreendidos, e assim, causa de imposição.

Isaías respondeu: "Eu não vi Deus algum, nem ouvi, numa percepção orgânica finita; mas meus sentidos descobriram o infinito em todas coisas, e como estivesse assim convencido, e ainda o estou, de que a voz da indignação honesta é a voz de Deus, não me preocupei com as consequências, mas escrevi."

Então perguntei: "A firme convição de que uma coisa é assim, assim a torna?"

Ele respondeu: "Todos os poetas assim o acreditam, e em eras de imaginação esta firme convicção removeu montanhas; mas muitos não são capazes de uma firme convicção de coisa alguma."

Então Ezequiel disse: "A filosofia do Oriente ensinou os primeiros princípios de percepção humana: algumas nações mantiveram um princípio para a origem, algumas outro: nós de Israel ensinamos que o Gênio Poético (como vocês agora o chamam) foi o primeiro princípio e os outros meramente derivados, e essa foi a causa de nosso desprezo pelos Sacerdotes e Filosófos de outros países e de profetizarmos que se provaria afinal serem todos os Deuses originados no nosso e serem tributários do Gênio Poético; foi isso que nosso grande poeta, Rei David, desejou tão ardentemente e invoca tão pateticamente, dizendo que com isso ele conquista inimigos e governa reinados; e nós amamos tanto nosso Deus, que amaldiçoamos em seu nome todas as divindades das nações vizinhas, e afirmamos terem elas se rebelado: destas opiniões o vulgo veio a pensar que todas as nações seriam afinal subjugadas pelos judeus."

"Isto", disse ele, "como toda firme convição, é fatal que aconteça; pois todas as nações acreditam no código dos judeus e adoram o seu Deus, e pode haver maior sujeição?"

Ouvi isso com algum espanto, e devo confessar, minha própria convicção. Após o jantar, pedi a Isaías que favorecesse o mundo com suas obras perdidas; ele disse que nenhuma de valor se perdera. Ezequiel disse o mesmo das suas.

Também a Isaías o que o fazia caminhar nu e descalço durante três anos? ele respondeu:

"O mesmo que nosso amigo Diógenes, o grego."

Perguntei então a Ezequiel por que comia lama e se deitava por tanto tempo em seus lados direito e esquerdo? ele respondeu : "O desejo de despertar outros homens para uma percepção do infinito: isto, as tribos norte-americanas praticam, e é honesto aquele que resiste a seu gênio ou consciência, visando apenas conforto ou gratificação presentes?"

A antiga tradição de que o mundo será consumido em fogo ao final de seis mil anos é verdadeira, conforme ouvi no Inferno.

Pois o querubim com sua espada flamejante tem aqui ordens de deixar a guarda da árvore da vida; e quando ele o fizer, toda a criação será consumida e parecerá infinita e sagrada, enquanto agora parece finita e corrupta.

Isto ocorrerá com um aperfeiçoamento do prazer sensual.

Mas primeiro a noção de que o homem tem corpo distinto de sua alma deve ser banida.

Isto deverei fazê-lo imprimindo no método infernal, com corrosivos, que no inferno são salutares e medicinais, solvendo superfícies aparentes, e expondo o infinito que estava oculto.

Se as portas da percepção fossem limpas, tudo apareceria ao homem como é, infinito.

Pois o homem fechou-se a si mesmo, até ver todas as coisas pelas estreitas fendas de sua caverna.

Tradução de Dênis Urgal, texto tirado do livro "O Matrimônio entre o Céu e o Inferno"

William Blake
William Blake (Londres, 28 de novembro de 1757 — Londres, 12 de agosto de 1827) foi poeta, pintor, sendo sua pintura definida como pintura fantástica, e tipógrafo.

Em 1790, publicou sua prosa mais conhecida, O matrimônio do céu e do inferno em que formula uma posição religiosa e política revolucionária na época: "a negação da realidade da matéria, da punição eterna e da autoridade".

A passagem "Se as portas da percepção fossem limpas, tudo apareceria ao homem como é, infinito." influenciou tanto Aldous Huxley em seu livro "As Portas da Percepção", quando Jim Morrison na escolha do nome de sua banda, The Doors.

-Você já leu as poesias de Lawrence Ferlinghetti?

The angels of the good and the bad

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quinta-feira, 25 de junho de 2009

Astoria - Sabrina Barrios

para Marcio



Sabrina Barrios é ilustradora e designer original de Santa Maria - RS, tchê. Colorada faca na bota acabou de se mudar para Nova York e já começa a transpirar a cidade em sua arte. Mais design, colagens, formas e cores no Flickr da moça.

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-Ilustrações de uma galera foda

quarta-feira, 24 de junho de 2009

O que te inspira - Karol Felicio

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Ilustração do caderno de Croquis Pagu - 1924


Eu não sei colocar preços nas coisas. Um João me ofereceu “um trabalho independente de poesias com desenhos em nanquim a uma quantia voluntária” eu quis, mas não comprei, eu não gostaria de por um preço no João.

Também não sei o quanto vale o meu sossego. Mas sei que vale muito. Eu pago caro por você. Você é o escambo que fiz pelo meu sossego.

[No que você pensa enquanto eu penso nele? Normalmente você faz silêncio...]

Eu não tenho tido tempo de pensar. Preciso silenciar, deixar o corpo calar, e parir palavras que derramem no papel.

Hoje eu vi tantas coisas belas, rosas de tantas cores, laranjas amarelas, como nunca as tinha visto. Fluorescentes. Florescendo.

Também tinha um velhinho corcunda, sentado sob o busto de um senhor esguio, na escada. Seria D. Pedro? Ele usava óculos engraçados.

O que te inspira?

Karol Felicio é mulher e sabe o que quer. Filha de Pagu, jornalirista made in Espírito Santo gosta que devorem suas poesias(indigestas ou não) aqui ou em seu blog. Com garfo e faca ou com as mãos.

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segunda-feira, 22 de junho de 2009

"Solstício de Inverno" - Raquel Espírito Santo

Solstício de Inverno from Raquel Espirito Santo on Vimeo.



Formada pelo SENAC, Raquel Espírito Santo é fotógrafa e, nas horas vagas, investe também em outra paixão: curtas-metragens e clipes em stopmotion. Os incríveis dreads do seu cabelo são sua marca registrada e a fazem inesquecível e reconhecível em qualquer lugar que vá! Mais produções da moça em seu site

sábado, 20 de junho de 2009

Em cartaz - Bárbara dos Anjos

-Leia mais poesias da Bárbara aqui!

Se um dia eu fosse resumir nosso amor, seria em forma de trailer
Como uma chamada desses filmes de casal, meio cabeça, meio banal
Uma edição lenta, algumas boas piadas e muitos diálogos de impacto
Tudo com uma trilha de bossa nova em inglês, editadas num compacto

Nosso amor não é um clipe frenético de uma banda indie e decadente
Com beijos confusos, rápidas imagens recortadas
E poucos momentos de amor entre brigas mal consertadas.

No final deste filme que sou mais que atriz
Quero um final agridoce: alegre mas meio em aberto
Só para provar que a vida é uma eterna escolha em ser feliz.

Mesmo tendo passado muito tempo da faculdade na biblioteca lendo clássicos da literatura, a gaúcha Bárbara dos Anjos não tem vergonha de assumir que adora comédias românticas e músicas da Britney Spears.

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quarta-feira, 17 de junho de 2009

Cheiroso - Cidadão das Nuvens

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Para Delourdes de Jesus (vó)


O travesseiro que herdei da infância
- e até hoje descansa a minha cachimônia -
nada tem do tempo
em que éramos bebês.

Cheiroso nasceu em São Paulo, 1983.

De seu primeiro manto (fronha)
nenhuma especulação,
lenda ou fotografia ;
o retalho e a linha
substituídos no primeiro transplante,
aos onze anos de idade ;
engorda-lhe-ia algodão,
ao invés de espumas,
não fossem afiadíssimos
os dentes que, fatidicamente,
esvaziaram-no
na virada do milênio.

Moldado, pouco a pouco,
em cirurgias necessárias,
notei-lhe o novo apenas
ao achar, dia desses,
um olhar
de parente distante
na bagunça do chão.

Querido e criminoso tempo,
seu capanga - disfarçado, quase sempre
de rotina - levou a fronha
do Cheiroso, o retalho
do Cheiroso, a linha
e o algodão do Cheiroso.

Ele que não ouse,
jamais, levar
- fruto do sopro
de minha avó costureira -
a alma do Cheiroso :

tudo que lhe resta
do dia do presente.

Renato Silva é um estudante de letras, está formando um grupo de poetas em sampa, ama o São Paulo e torresmo com cerveja. Não acredita no homem em si, mas crê na humanidade. Adora que o chamem pelo nome, mais ainda quando pelo "codinome": Cidadão das nuvens. Você pode ver mais poesias dele no seu blog

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domingo, 14 de junho de 2009

Cowboy lírico e o sorvete de creme - Frico

Neste domingo está rolando a parada gay na Avenida Paulista. Segue uma pequena homenagem beat do Clube à diversidade e liberdade de sexualidade.

O cowboy lírico entra no velho boteco
Toca Bob Dylan no iPod do traveco
"Quero conhaque nacional, meu chapa"
O fora da lei escarra seu pedido na lata

"As coisas estão mudando", diz o garçom
Ele é gay e tem um terninho marrom
"Assistiu "Milk" no espaço Unibanco"
É preto mas transa um playboy branco

Ontem eu saí de mãos dadas com meu homem na Paulista
Ninguém me xingou de bicha, isso foi uma conquista
Espero que um dia meu filho não precise fingir
Que pensa em mulher antes de dormir

"Os dias estão bem mais quentes, né?"
O taxista está suando em bicas debaixo do boné.
"É sim, meu truta, o tempo está louco"
"Temos que fazer alguma coisa, gritar até ficar rouco"

Não sei, será tão ruim um pequeno apocalipse?
Os bons se salvarão num eterno eclipse
Os homens morrem mas o universo segue imenso
Os dinossauros foram pro saco e ninguém ficou tenso.

"Me dá um dinheiro senhor, eu também tenho fome"
Eu tenho dinheiro, mas não dei, hoje ele não come
ver muitas vezes a Mona Lisa faz dela uma puta
Ver muitas vezes a miséria tira a fé na nossa luta.

O Cowboy lírico dispara certeira sua poesia
Cria universos vermelhos de uma gostosa anarquia
Liberdade não é bagunça, diz a pichação na minha cidade
Rita Cadillac rebola celulite e idade

"Gosto de mulher assim, saca? De verdade"
"O que é a verdade, meu querido? Homem é diversidade"
"Você gosta de homem, eu gosto de poesia."
"Sua verdade heterossexual me mata de asia. "

Conhaque agradável, fica saboroso com cerveja.
Essa música do Radiohead faz sentido com tristeza.
Não existe uma verdade, mas existe a felicidade?
Filósofo de boteco, vá beber na faculdade.

Vou ensinar os alunos a serem felizes, ensiná-los o gosto
Da chuva? Do corpo banhado em vinho? Das covinhas do seu rosto?
Não, tenho a felicidade sintetizada num wireframe
Se resume a um pote grande com calda e sorvete de creme

Frico deixa de lado a carcaça branca machista quando sonha que "Espero que um dia meu filho não precise fingir". Além do jornalismo que lhe paga o salário, ele escreve poesias e resenhas em seu blog Punk Brega

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sexta-feira, 12 de junho de 2009

Keep Walking, Neruda Walker - Fabiane Zambon

Acontece que me canso de meus pés e de minhas unhas,
do meu cabelo e até da minha sombra.
Acontece que me canso de ser homem.

Todavia, seria delicioso
assustar um notário com um lírio cortado
ou matar uma freira com um soco na orelha.
Seria belo
ir pelas ruas com uma faca verde
e aos gritos até morrer de frio.

Passeio calmamente, com olhos, com sapatos,
com fúria e esquecimento,
passo, atravesso escritórios e lojas ortopédicas,
e pátios onde há roupa pendurada num arame:
cuecas, toalhas e camisas que choram
lentas lágrimas sórdidas.

Walking around. Do Neruda, o Pablo.

- Ô. Diz que eu fui por aí.
- Si, caminar siempre.
- Enquanto houver o ritmo, a métrica e o . Tchau.
- Hasta, Neruda.
Nara Leão - Diz que eu fui por aí




Fabiane Zambon é atriz, mas tem vergonha de divulgar suas peças. Designer multimídia mas tem vergonha de ser artista. Poetisa da hipermída, mas com vergonha de divulgar os rabiscos. Esqueça as indecições dessa libriana e leia mais textos zaizers no seu Loading Myself

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terça-feira, 9 de junho de 2009

c' ést mon poème - Tereza Bettinardi


Sabrina Barrios está lá em Nova York, mas continua na sua função de caça talentos pro Clubinho. Desta vez ela me indicou uma designer/ilustradora que eu já conhecia, mas ainda não tinha fuçado o trabalho com afinco: a Tereza Bettinardi, que fez Curso Abril com a gente.



A Tereza é gaúcha, já trabalhou em lugares como a editora Abril e o Máquina Estúdio. Talentosa, além de arrancar elogios dos designers por onde passa, ela ilustra, faz colagem e até HQ como vocês podem ver no trampo acima que ela produziu nos tempos de faculdade. Mais produções da guria no seu Flickr

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segunda-feira, 8 de junho de 2009

O tedioso destino do seu nando - Amaury Pavão

-Amaury já escreveu um conto pro Clube, lembra?

.rapaiz do céu
.o seu nando tava lá sem ter o que fazer
.plantou bananeira
.nadou de costas
.bateu palmas
.nada o satisfaz
.flores secas
.água sem gosto
.angústia do diabo
.vida de ócio
.sabe-se-la-o-que
.novos tempos
.vida antiga
.tédio sempre

Amaury Pavão Filho é jornalista e programador, filho de jornalista e irmão de programador. Diz ter orgulho de Penápolis, cidade onde foi criado, mas não assitiu o Clube Atlético Penapolense tomando fumo do Pão de Açúcar na série A3. Escrevinha em seu blog e também é conhecido como Kustelinha pelos íntimos.

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quarta-feira, 3 de junho de 2009

Marisa - denisme


"Essa é a Marisa, esposa do açogueiro Euclides. Ela gosta de tocar harpa e anda por ae em uma carruagem puxada por uma baleia."


...Ou é ruim da cabeça

O paulista Denis Rodrigues de Freitas, 24 anos, quase nunca separa a vida da arte: ganha dinheiro como designer e ilustrador e, nas horas vagas, se enfia em seu ateliê em Santo André, onde mora, para experimentar técnicas de serigrafia, foto, impressão e texturas.

Há 10 anos, Denis faz graffitis nas ruas de São Paulo e da região do ABC, usando uma linguagem inspirada na caligrafia e na arquitetura gótica. Na maior parte de suas obras, escreve a sigla "DME", que aparece distorcida ou adaptada ao seu estilo, uma tentativa de abstraí-la . Mais trabalho do cara no seu Flickr

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terça-feira, 2 de junho de 2009

Luar do Sertão - Jáder Rocha

Jáder avisa: "Tirei da varanda de casa"

-Quer ler os textos do Clube de Ideias de Penápolis? Clique aqui!

"Oh que saudade do luar da minha terra
Lá na serra branquejando, folhas secas pelo chão
Este luar cá da cidade tão escuro
Não tem aquela saudade, do luar lá do sertão!
Se a lua nasce por detras da verde mata
Mais parece um sol de prata, prateando a solidão
E a gente pega na viola e ponteia
E a canção e a lua cheia, a nascer no coração

Não há, ó gente, oh! Não, luar como esse do sertão

Quando vermelha no sertão desponta a lua
Dentro da alma flutua, tambem rubra nasce a dor
E a lua sobe e o sangue muda em claridade
E a nossa dor muda em saudade
Branca assim da mesma cor

Música de Catulo da Paixão Cearense / João Pernambuco"

Jáder Rocha é professor há milênios e não se conforma com os rumos que a educação tomou no Brasil. Fundou seu imaginário Clube de Ideias na pequena cidade de Penápolis, onde discutia política, filosofia e educação. Anda em falta com os textos, mas nos manda este retrato do luar do sertão.

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